
Visibilidade
Já imaginou viver em um corpo que não é seu e ainda ser taxada como transtornada quando pedir ajuda?! é exatamente essa realidade que pessoas transexuais enfrentam todos os dias dentro da sociedade. É de extrema importância mencionar que a transexualidade não é uma doença, mas sim uma particularidade que merece atenção e compreensão especial.
O entendimento da sexualidade vai para além das questões de órgão genital e do entendimento de sexualidade como referência ao ato de reprodução sexual. Além de desassociar a vinculação normativa da sexualidade como modelo das relações heterossexuais, também fica o entendimento que sexualidade se associa a toda faixa etária, da criança ao idoso.
A transexualidade deixou efetivamente de ser considerada um transtorno mental pela Organização Mundial da Saúde (OMS) no dia 1° de janeiro no ano de 2022, mas o Conselho Federal de Psicologia (CFP) orientava os profissionais a não tratar esse tema como uma patologia já no ano de 2018. Mesmo com esse cenário, pessoas trans não tem assegurado direito a vida plena é de extrema dificuldade a aceitação dessas pessoas, a expectativa de vida delas no Brasil é de aproximadamente 35 anos de idade.
Para as mulheres trans essa dificuldade pode ser considerada ainda maior, como explica Aymme Andrade que iniciou sua transição aos 12 anos de idade e conta como foi o processo: “As maiores dificuldades do inicio da transição são as marcas masculinas. O corpo, a voz muito grave, os pelos no rosto e por mais que uso maquiagem fica a marca escura. As pessoas ficam sem saber como lidar totalmente no feminino, pois ainda existem traços masculinos”.
A homofobia e a transfobia podem ser superadas, principalmente, se forem praticadas discussões e debates desde a educação fundamental a educação superior. O respeito pelas próprias escolhas é um direito social, então cabe a todos respeitarem a escolha de cada um.
Para bióloga Julia Pétra dos Santos Souza, a passagem pela universidade sendo uma mulher trans foi repleta de desafios: “Os colegas da minha turma foram muito receptivos e acolhedores quanto a minha decisão, me dando força e coragem, mas foi no convívio com a instituição UNEMAT (docentes e corpo técnico) que enfrentei os maiores desafios, não tive meu nome social respeitado nas listas de presença, no portal do aluno, nem se quer pelo SAA, na colação de grau não foi diferente.”
Saúde e Trabalho
A Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA), fundada em 29 de janeiro de 2018 como forma de manifestação, resistência e luta contra da violação dos direitos humanos no Brasil, realiza anualmente um dossiê com levantamento de assassinatos e violência contra travestis e transexuais brasileiras.
Segundo o levantamento, em 2023 houve um aumento de mais de 10% nos casos de assassinatos de pessoas trans em relação ao ano de 2022, e destaca o fato de que o Brasil ocupa o topo como o que mais consome a pornografia trans em plataformas de conteúdo adulto, e em contradição a isso, o país é destaque mundial também ao ocupar o 1° lugar como o que mais mata transexuais e travestis no mundo pelo 15º ano seguido.
A estimativa levantada pela ANTRA, apenas 10% da população transexual possui empregos formais, enquanto os demais 90% se encontram, em grande parcela, na prostituição por barreiras impostas por preconceito e conservadorismo.
A TransEmprego é um projeto de empregabilidade de pessoas trans no Brasil, e mesmo com a criação de políticas voltadas a inclusão dessa minoria é difícil a inserção e a permanência no emprego formal.
Nos dias atuais, muitos acreditam que antigamente as pessoas eram heterossexuais e cisgênero e só, mas isso é mito, pois as questões de gênero e sexualidade existem a mais tempo do que se pensa, mas mesmo assim não tem a mesma visibilidade dentro de pesquisas e projetos.
Ao falar de sexualidade no Brasil, compreende que a mesma é influenciada por uma série de fatores, em que inclui cultura, religião, educação, preconceito, conservadorismo e normas sociais implícitas na sociedade. Cada indivíduo possui em si uma singularidade, onde envolve aspectos sociais, individuais, atitudes, práticas e simbolizações de uma experiência única e marcada fortemente pela realidade a qual cada indivíduo vive ou é inserido.
A estimativa do Ministério da Saúde é de que 4 milhões de pessoas no Brasil sejam transgêneras ou não binárias, segundo dados do Banco Mundial, parte dessa população se reconhece mulher, vivendo o desafio de ter identidade de gênero diferente daquele atribuído ao nascimento.
O atendimento feito pelo SUS inicialmente a esses usuários, era somente como políticas de prevenção e tratamento de Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST), ainda na primeira década de 2000. Com a edição da portaria GM/MS n°2.803, de 19 de novembro de 2013, a pasta foi redefinida, ampliando a cobertura do SUS para essa população.
O regramento previa a habilitação de estabelecimentos de saúde na modalidade ambulatorial e hospitalar, e garantia a integralidade do cuidado para as pessoas trans. Os serviços ambulatóriais ofereciam acompanhamento clínico, pré e pós operatório, além da hormonização, que era realizada por uma equipe multiprofissional.
Em 2022 a portaria GM/MS n°4.700, em 29 de dezembro, alterou os critérios para cirurgia de redesignação sexual e construção neovaginal. A hormonização para pessoas trans é um dos processos mais desejados para quem esta em fase de transição de sexo biológico, passo fundamental para alinhar o corpo com a identidade de gênero.
A trajetória de uma pessoa trans é marcada por uma luta incansável para alcançar a igualdade de direitos. As dificuldades enfrentadas no acesso a saúde, permeia por diferentes níveis de atenção, estão entres eles o preconceito, a falta de informação, despreparo de profissionais de saúde no relacionamento com pessoas trans e a desarticulação da Rede Básica a Saúde e Rede de Atenção Psicossocial, estão entre as dificuldades enfrentadas pela população trans.
A descoberta da sexualidade é um período natural que acontece de forma individual para cada pessoa, não escolhe idade, e não deveria ser tabu. Alguns grupos tem passado por essa fase de forma mais pesada, ou seja, não podendo contar com a família que deveria ser sua rede de apoio. Muitos acabam por si só buscando ajuda com outras pessoas da comunidade LGBTQIAPN+, por não ter condições ou mesmo por falta de informação referente a profissionais que podem acolher e assim fazer com que entenda seu processo de auto conhecimento.

Respeito
O respeito se inicia com aceitar as diferenças, e se sentir seguro em um espaço para diálogo e diversidade. A orientação sexual torna as pessoas únicas com suas diferenças e semelhanças. Mesmo com todas as conquistas e leis, o desrespeito é maior e até mesmo velado, sendo impossível a execução da cidadania. Em meio ao século XXI, o respeito não é para todos!
De forma mais clara o desrespeito e a não aceitação às identidades trans provocam todos os tipos de violência, iniciando com a verbal, a violência física e a violência psicológica. A fobia da aversão de um ser humano e o medo exagerado a outra pessoa em relação a transexualidade é estrutural. A população trans sofre com a negação e a descriminalização da sociedade por puro preconceito.
O sentimento de pertencer a um sexo com que não nasceu em meio a uma sociedade machista, egoísta e transfóbica traz dificuldade de convívio a população trans. Julia Pétra, retrata como se sentia nesse meio “me senti como um extraterrestre, um corpo estranho de outra espécie, era apontada, objetificada, em alguns momentos alvo de piadas.” Então o que significa pertencer a uma sociedade?
De acordo com o Dicionário Online de Português a transfobia é “um ódio patológico direcionado aos transexuais, às pessoas que não se identificam com o seu gênero de nascimento”. Em qual século foi pontuado que azul é de menino e rosa é de menina? As pessoas estão seguindo regras que não sabem o ponto de partida, a agressão, o julgamento traz confusão e a confusão gera violências.
De acordo com a CNN Brasil, em 2019, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu pela criminalização da transfobia, que passou a ser enquadrada pela Lei de Racismo. Sim, transfobia é crime! Todo tipo de violência é crime, não importa em qual grau, em uma sociedade a igualdade deve ser colocada em prioridade, como é colocado os direitos e deveres.
Aymme Andrade diz “Eu sei que vou sair viva, mas não sei se vou voltar viva” e é o cotidiano das mulheres transexuais. Em um local de pertencimento e seguro onde possa se sentir à vontade para ser de corpo e alma quem é. Mas ao pisar o pé para fora desse local seguro, o medo, a angústia, a tensão se colocam em primeiro lugar. E nem sempre o local seguro é dentro da própria casa.
A descriminalização acontece em qualquer local. E coloca a população trans a estar sempre alerta, saber e sentir que a qualquer momento pode sofrer agressão, que em segundos voltar para casa vivo deixa de ser uma escolha e vira dúvidas. Ter os mesmos deveres, mas não ter os mesmos direitos, porque pertencer a uma sociedade então? Essas atitudes são pontuadas quando falamos em suicídio.
As estatísticas, não são somente estatísticas, são a realidade de algo maior, a realidade em viver em uma sociedade transfóbica e ter medo de se expressar e acabar debaixo da terra sem dignidade e nem zelo. Precisar se esconder todos os dias e não ser quem realmente quer ser.
A vulnerabilidade e a restrição social traz diversos problemas para as mulheres trans, como ansiedade e depressão. E a falta de apoio familiar dificulta ainda mais a convivência. As mulheres transexuais lutam por um tratamento digno desde o início da sua transição, ser reconhecida e ser chamada pelo seu nome social é um pedido constante de “Respeitem quem eu sou”. O respeito não é para todos, pois nem todas as pessoas aprendem a respeitar, mas todos merecem o respeito! Resistir para existir e existir para reagir.

Os profissionais da psicologia têm um papel fundamental na ajuda e defesa do público LGBTQIAPN+. A psicóloga Natalia Carvalho fala sobre a importância de buscar um profissional que trabalha com a compreensão da identidade de gênero e da sexualidade de forma saudável, além de fornecer apoio emocional para superar os desafios, “Saiba escolher o profissional, vai lá e veja se ele tem registro, se realmente é psicólogo”, reforça a profissional. Ela que é especialista em sexualidade e atende como PSICOLGBT, diz que os atendimentos ao público LGBTQIAPN+ aumentaram por conta de uma conta numa rede social, que faz atendimento online e atende todo o território nacional.
A Psicóloca deixa mensagem para as mulheres transexuais.
Créditos: Alana Garcia, Janderson Ribeiro e Séfora Zambrini.
