A migração de jovens em busca do ensino superior no Mato Grosso

Jovens deixam suas cidades natais em busca de educação superior de qualidade; conheça as histórias e os impactos da jornada desses estudantes

A migração de jovens e adultos em busca do curso superior é um fenômeno que cresce e se torna cada vez mais comum no Brasil. Esses estudantes que deixam sua cidade natal e suas famílias em busca da universidade, encontram nessa movimentação uma série de desafios.

Os motivos para esses estudantes mudarem de cidade são diversos, como a cidade de origem ainda não ser contemplada com a presença de uma universidade, ou a universidade não possui o curso desejado, o desejo por uma universidade específica devido a excelência acadêmica como a Universidade de São Paulo (USP) ou a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), outras vezes, pelo custo dos estudos, por programas de pós graduação e entre outros.

Acredita-se que o crescimento dessa prática pela instauração de programas como o Sistema de Seleção Unificada (SiSU) e o Programa Universidade para Todos (ProUni), esses programas possibilitam que as universidades recebam diversos estudantes de todas as regiões do país. 

Na Universidade do Estado de Mato Grosso (Unemat), o fenômeno também se faz presente, alunos de todo o país se encontram em um intercambio cultural dentro da sala da aula. No campus de Tangará da Serra as regiões Sul e Sudeste se destcam após a região Centro-Oeste

Infográfico com dados de alunos migrantes da Unemat de Tangará da Serra. Fonte: SAA – Unemat Tangará da Serra

E no processo social e de formação cidadã que a universidade exerce sobre os indivíduos, a origem geográfica é um fator crucial na jornada dos estudantes, indo muito além do processo de deslocamento de curta ou longa duração, mas incluí questões culturais, vínculos afetivos, sonhos, expectativas e vulnerabilidade mental, física e financeira.

Recurso e auxílio

Visto essas questões, as universidades buscam meios de amparar esses estudantes, como auxílios de permanência como moradias estudantis, ou auxílios de despesas como alimentação e moradia. Em alguns casos as instituições também oferecem amparos para realizações acadêmicas como auxílios para participação de eventos e/ou apresentações de trabalho. 

Mas ainda com esses recursos disponíveis, a Universidade não consegue suprir as necessidades dos estudantes nem mesmo os contemplados pelo auxílio. Na Universidade do Estado de Mato Grosso (Unemat), os auxílios alimentação e moradia somadas ficam no valor de R$700,00. “Não é suficiente, tendo em vista o custo médio de vida na cidade, é pouco.  Nem todos os alunos têm a ajuda dos pais assim como eu, e ainda com ajuda tenho que fazer algum trabalho por fora para complementar a renda”, afirma Samara Freire, estudante de jornalismo na Unemat de Tangará da Serra. 

A  insegurança financeira é um dos fatores mais citados entre os motivos de desistência da universidade, em universidades privadas, por exemplo estudantes que não possuem bolsa ProUni tem a maior taxa de desistência, cerca de 60%, e para alunos no FIES o número é de 62% dos que não tinham bolsa. Os dados são do Censo do Ensino Superior de 2022 – Inep/MEC.

Mas a adaptação não fica apenas em recursos financeiros, mas também de mobilidade. Estudantes do interior que não têm familiaridade com o transporte público podem ter dificuldades para se locomover na cidade e até os universitários com experiência se deparam com linhas confusas e explicações nem um pouco prestativas que terminam com uma experiência traumática e sem acesso a mobilidade justa.

Rede de apoio e distância familiar 

Receber suporte neste período de transição é indispensável e nos âmbitos emocionais e psicológicos ainda menos. Mudar de cidade significa ficar distante de família e amigos próximos, o que pode causar um sentimento de solidão e desamparo. Essas relações sociais funcionam com redes de apoio aos desafios diários que causam, a falta dela pode gerar consequências severas à saúde psicológica como depressão e ansiedade. 

Segundo dados da Covitel 2023 (Inquérito Telefônico de Fatores de Risco para Doenças Crônicas Não Transmissíveis em Tempos de Pandemia) 9,6% da população brasileira receberam o diagnóstico de depressão e cerca de 26,8% de ansiedade, sendo o Centro-Oeste a região mais ansiosa e a faixa etária mais acometida foram jovens entre 18 e 24 anos. “O maior desafio que eu enfrentei tendo uma cidade nova é estar aqui sozinha, estar aqui sem conhecer absolutamente nada, nenhuma pessoa” Afirma Isabela Alves Vieira, estudante de jornalismo na Unemat de Tangará da Serra.

Isabela Vieira no aeroporto de Cuiaba no dia que se mudou. Foto: Arquivo Pessoal

Nesse período é importante que o estudante encontre um equilíbrio entre as necessidades da vida pessoal, se tornar restrito e socialmente distante pode agravar nessas situações. Construir redes de apoio ou contar com as que já estão consolidadas ajudam a enfrentar os desafios de adaptação à nova fase do estudante, Isabela conta sobre como a rede de apoio facilitou a adaptação, “meus pais me apoiam tanto emocionalmente quanto financeiramente. E também fiz amizades incríveis aqui que deixaram a caminhada universitária mais fácil de lidar.” afirma a estudante. 

Diferenças culturais 

Dialetos diferentes, preparo de alimentos e até no horário de funcionamento de estabelecimentos, essas diferenças culturais e sociais que podem variar entre estados e cidades também interferem no processo de adaptação. Elias de Lima, estudante de Engenharia Civil da Unemat, percebe diferença na culinário desde que se mudou de Rondônia para o Mato Grosso, “na questão gastronômica, pude notar umas diferenças sim, e não foi por falta de procura mas percebi que pratos típicos de Rondônia como Tacacá e Vatapá não muito visto por aqui”, diz o estudante.

As diferenças de ambiente também são uma dificuldade. O território brasileiro tem mais  de 8 milhões de km2 e cerca de seis biomas diferentes divididos entre os estados. Em biomas como o Cerrado, as estações do ano não são muito notáveis no clima, inclusive são popularmente conhecidas como seca e chuva, onde são 6 meses de cada período com características que o próprio nome já diz. 

A mudança climática entre os territórios brasileiros também é enfrentada por esses estudantes migrantes. Iago Mattos, migrante do Paraná, estado do sul do Brasil, enfrentou o desafio da estação da seca do Cerrado mato-grossense “A maior diferença é o calor, mas assim disparadamente,  é bizarro. A  média semanal aqui é de 33 graus, 32 graus, isso eu pegava assim em dias de verão, aqui parece que é verão o ano todo.

A divergência de culturas é uma dos desafios mais comuns enfrentados, pode ser estressante, mas para alguns pode também ser uma experiência de diversão e descoberta das diferenças,o fato de conhecer outras pessoas, lugares, comidas, comidas e cultura no geral já é um benefício” relembra Isabela acerca de se mudar para outro estado. 

Relato de Isabeli Pinheiro, estudante de jornalismo na Unemat sobre diferenças culturais

Sonhos e expectativas de oportunidades

O aumento dessa mobilidade entre os universitários também significa benefícios, esse acesso a espaços com melhor estrutura tecnológica e aos mais diversos cursos permitem que os estudantes tenham uma formação mais completa e satisfatória, reduzindo a evasão e possibilitando que mais pessoas alcancem o nível superior “Eu me sinto muito contemplada para fazer o jornalismo. Foi um divisor de águas na minha vida. Vir para Tangará da Serra. Se dissessem para Maria Tereza da pandemia, que ela ia viver tudo isso que ela está vivendo agora, parecia um surto ou um sonho. Mas eu me sinto muito feliz e, sem dúvida, eu trocaria tudo para vir para cá novamente” Afirma Maria Tereza, estudante de jornalismo na Unemat. 

O fenômeno da busca pela universidade traz consigo uma série de desafios, mas também traz oportunidades e realização pessoal de diversos jovens e adultos brasileiros. Com políticas públicas adequadas e o fomento das práticas de incentivo a universidade é possível minimizar os desafios e tornar esse processo mais democrático e justo para os migrantes universitários.

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